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Quando Regina Claudia conheceu o ritmo encantador da dança dos dedos materializado nas mãos de uma trancista, o penteado ainda estava longe de ser considerado “da moda”. Com um sorriso saudoso no rosto, ela relembra os domingos em que durante o almoço de família a mãe e a avó se juntavam para trançar o cabelo dela e das 5 irmãs. “Aos domingos, depois do almoço nós sentávamos no quintal e aí era hora de lavar o cabelo e pentear o cabelo, então a minha avó e a minha mãe faziam as tranças na gente” , relembra Regina.

Em 2018, a herança ancestral que já foi o penteado planejado para resistir a uma semana de aulas escolares, se tornou a Clô Tranças. “E eu digo para você que essa dádiva aí ficou na minha responsabilidade, eu passei a pentear minhas irmãs, eu passei a pentear as minhas sobrinhas e hoje eu sou a trancista da família”.

Desta forma, o empreendimento para Regina é mais do que uma forma de aumentar a renda da família e se tornou também um meio para ensinar e cuidar. Ela argumenta que enquanto trança os cabelos de seus clientes e familiares, aproveita para compartilhar histórias sobre o significado das tranças para a cultura africana durante a colonização e a ressignificação do penteado aqui no Brasil. “Eu vim falando da autoestima, eu vim falando do embelezamento, eu venho falando desse símbolo de resistência. Quem usa trança precisa saber o porquê usa, para o que usa, de onde vem a trança, cada vez que eu ponho a mão na cabeça de uma cliente, é um período que ela vai ouvir a história da trança, ela vai saber porque ela está trançando o cabelo.” exalta Regina ao relembrar os motivos que a fizeram investir no poder de transformação educacional da Clô.

Ensinar é mesmo um dom da empreendedora. Formada em administração de empresas, Regina é professora há 9 anos e qualifica pessoas sobre rotinas administrativas para facilitar a entrada no mercado de trabalho. A formação fez pulsar o sonho de empreender, mas não era suficiente para resolver as dores e burocracias do início dessa jornada. Ao longo dos anos, revezou sua rotina de professora com o lugar de aluna e fez mais de 5 cursos sobre empreendedorismo. Porém, Regina conta que sua maior dor só foi resolvida quando conheceu o projeto Tamo Junta, uma iniciativa da Aliança Empreendedora em parceria com a J.P. Morgan.

Os conteúdos do curso abriram os caminhos para que Regina encontre a melhor forma de fazer a transição da sua empresa de ME para MEI, que acontecerá em janeiro. A adequação é fundamental para que a empreendedora participe de editais, cursos e seja tributada conforme o rendimento real da Clô . “ Eu acabo ficando perdendo muitos trabalhos, justamente pela minha categoria(ME), então isso é uma coisa que anda me empatando.” lamenta Regina.

Além das questões técnicas, o Tamo Junta apoiou Regina nos planos de ampliação do seu negócio. E os sonhos vão desde advogar pelo reconhecimento da profissão de trancista, ainda limitada a categorização de cabeleireira, até promover workshops ensinando a atividade para o empoderamento financeiro de pessoas da comunidade em que mora. “A Aliança Empreendedora me traz a liberdade de mostrar a minha cara, que eu estou lá na periferia, que eu tenho um sonho e é possível sim eu colocar em prática, porque eu faço o diferencial na minha região. Então, eu tenho a prática e a Aliança Empreendedora me traz a teoria de forma gradativa, de uma forma tão simples que eu acabo perdendo o medo” comemora Regina ao relembrar o método de capacitação e apoio ofertado pela organização.

Moradora do Bairro São Rafael na Zona Leste de São Paulo, Regina conta que reconheceu o potencial da profissão durante a pandemia, quando notou os desafios enfrentados pela comunidade que carecia de cuidado. O que poderia ser ressignificado durante as horas dedicadas ao trançado do cabelo. Quase como uma sessão de terapia, Regina diz que se preocupa em trançar com delicadeza e cuidado para “que não haja tração no trançar, para que eu não traga dor”, ressalta Regina ao afirmar que não há dia ruim ou conversa triste, que resista a uma trança feita com amor. “E a conversa flui comigo trançando o cabelo daquela pessoa e não termina com a tristeza. Termina com sorriso, ‘caramba, olha essa trança que você fez!’”.

Para ela, esses detalhes são fundamentais, pois são seus diferenciais na hora de compartilhar seu conhecimento. Trabalhar com embelezamento, principalmente de mulheres pretas, é a forma que Regina encontrou de eternizar a herança de cuidado recebido da sua família, exaltando a autoestima e identificação de quem está usando, afinal,  “Aquele penteado faz parte de quem ela é”.

Mas, antes de empoderar outras pessoas, Regina precisou encontrar a própria força. Durante as aulas do Tamo Junta, ela entendeu que existia um caminho com passos para fazer a Clô acontecer. “Hoje eu tenho um norte de onde eu quero chegar”, comemora Regina. Se antes, limitações financeiras pareciam paralisar os sonhos da empreendedora, agora ela sabe que existem estratégias para aumentar o público, otimizar o uso das redes sociais e impulsionar o acúmulo de capital necessário para executar as melhorias que seu negócio precisa, como a ampliação de um espaço exclusivo para Clô. Hoje ser trancista para Regina, faz parte de um projeto de reconhecimento. Tirar a profissão da sazonalidade, desconstruir o estigma do cabelo crespo e levar educação racial para comunidade em que vive são metas que também fazem parte do planejamento da Clô.

Por isso, seja trançando os cabelos da mãe, das irmãs, dos 3 filhos, dos 6 netos ou de seus clientes, Regina é movida pela materialização do cuidado. “Dentro da minha religião eu fui reconhecida com um cargo, e esse cargo, é incrível dizer, é um cargo de cuidadora. Onde eu tenho uma responsabilidade de orientar as pessoas.” se alegra Regina ao lembrar a aclamação recebida no candomblé. 

 

Sobre o Tamo Junta

O projeto que Regina Claudia participou, o Tamo Junta, é uma realização da Aliança Empreendedora em parceria com a J.P. Morgan e tem como objetivo capacitar e apoiar 5 mil mulheres empreendedoras negras na capital paulista e na região metropolitana de São Paulo. 

A capacitação é gratuita e voltada especialmente para a realidade de mulheres negras que tenham um pequeno negócio ou trabalhem por conta própria e, entre outros temas, são abordados tópicos como marketing e vendas, precificação, gestão financeira, e os cuidados relacionados à saúde mental para mulheres que empreendem.

Realizado desde maio de 2023, o projeto segue com inscrições ainda abertas com vagas limitadas. As empreendedoras que quiserem participar podem optar pelo formato que melhor se enquadra no seu tempo disponível para estudo: presencial em encontros que  em diversas turmas itinerantes, via WhatsApp com atividades assíncronas e síncronas guiadas por facilitadoras, ou ainda de forma totalmente assíncrona pela plataforma Tamo Junto – com o curso Rainhas do Empreendedorismo, criado para inspirar e empoderar empreendedoras que precisam daquele impulso no desenvolvimento de seus negócios.

A jornada de conteúdo do projeto foi desenvolvida para descomplicar termos técnicos através de uma linguagem simples, trazendo dicas e práticas que podem ser aplicadas à realidade de micro e pequenos negócios, com foco em habilidades de gestão, para contribuir com o fortalecimento e empoderamento econômico do público atendido. Além do acesso ao conteúdo, as participantes poderão se inscrever para 500 vagas de mentoria com voluntários do Programa Guru de Negócio da Aliança Empreendedora. A mentoria é um método de apoio que após as capacitações fortalece ainda mais esses negócios, com as empreendedoras recebendo acompanhamento continuado de um especialista para troca de experiência e orientação adequada.

“As periferias paulistas carregam grandes potências empreendedoras que se dão seja por necessidade ou por vocação. Queremos fortalecer o empoderamento feminino negro e contribuir com a auto-percepção empreendedora e de identidade com as mulheres negras, através da capacitação e a conexão gerada pela integração a uma rede. Acreditamos no impacto positivo que essas ferramentas podem trazer não só às mulheres capacitadas como a toda a comunidade a qual elas pertencem.” afirma Camila Maria Reis, coordenadora de projetos da Aliança Empreendedora. 

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