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Um movimento muito ativo e conectado ao empreendedorismo é a geração de impacto social, indo além da renda. Saiba como essa perspectiva já faz parte da história e do contexto de muitos negócios criados por empreendedores da base da pirâmide.

Um forte espírito comunitário e tendência a formar ‘redes colaborativas’ nas próprias comunidades. Esses são dois pontos que saltam aos olhos quando o assunto é microempreendedorismo e geração de impacto. Os dados vêm de uma pesquisa realizada pela Aliança Empreendedora a partir de análise do perfil dos empreendedores que já foram atendidos pela organização.

De modo geral, os microempreendedores enxergam nos desafios da própria comunidade oportunidades para geração de negócios, levando produtos e serviços que não estão disponíveis ou são de difícil acesso a comunidades de periferias.

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O casal de empreendedores Adriano e Fernanda abriram e mantém o seu negócio de delivery de refeições no próprio bairro que residem, em Caruaru, Pernambuco, local onde também moram familiares e amigos. Além disso, três outras pessoas também do bairro são colaboradores contratados pelo negócio nos dias de maior movimento.

Segundo levantamento da Data Favela 2015, 63% dos empreendedores deseja abrir seu negócio na própria comunidade em que vive, e 19% quer empreender em regiões próximas.

Podemos dizer que, já na partida, a potência do impacto vem ‘embutida’ nas iniciativas desses microempreendedores devido a essa pegada territorial. Além de dinamizar as economias locais, engajar a própria família e pessoas da comunidade, a pesquisa da Aliança Empreendedora revela que 53% desses empreendedores possuem empregados, e que 20% desses empregos são formais.

Empreendedor da base vive a realidade que quer transformar

Para Fernando A. Simões Filho, sócio e um dos fundadores da Bemtevi – “um negócio social que investe em negócios sociais” -, o microempreendedor vive o desafio social da comunidade em que está inserido e, melhor do que ninguém, pode atuar para endereçar os problemas. “Um dos grandes desafios de todo empreendedor social é ter um processo de empatia para que ele esteja sempre entendendo a necessidade daquela pessoa e/ou comunidade que ele busca impactar positivamente. E o empreendedor da base vive isso, é um processo de empatia totalmente diferente e mais natural. Viver a realidade que se quer transformar é muito relevante e pode ajudar positivamente no desenvolvimento do negócio e na superação dos desafios que surgem. ”

Para ele, o desafio aqui – como em todos os negócios sociais – é trazer um modelo de gestão e equipe complementar que sustente o modelo como um negócio de longo prazo. Formar um time que se complemente, trazendo o olhar do impacto, do financeiro e da gestão do dia a dia do negócio.

“Acreditamos muito que os empreendedores da base da pirâmide têm enorme potencial para transformar sua comunidade e escalar esses negócios para outras comunidades. Porém, vejo que é necessário um apoio que cuide de sua formação como empreendedores. E essa formação não é uma planilha ou cartilha padrão. Cada empreendedor tem um perfil que precisa ser entendido e apoiado para poder se desenvolver. Um excelente caminho seria juntar recursos filantrópicos e de empréstimos para fomentar esses empreendedores das comunidades. O recurso filantrópico poderia apoiar o negócio no seu início, sendo esse apoio atrelado a um plano de desenvolvimento pessoal, para que esse empreendedor evolua e seu negócio possa crescer sem necessidade de filantropia no futuro”, aponta Fernando.

Lições de um microempreendedor

Em Sarandi, zona norte da cidade de Porto Alegre, nasceu o empreendimento Selected Barber Shop. Seu fundador, Willian Gomes da Silva, se tornou um microempreendedor há apenas um ano, mas já abriu uma segunda unidade de seu negócio, desta vez no bairro do Santinho, em Florianópolis. A unidade de Porto Alegre continua a todo vapor, gerenciada por cinco colaboradores. Em Florianópolis, onde hoje reside William, o trabalho vem sendo desenvolvido por três pessoas.

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“Eu corto cabelo desde os 16 anos, mas tive uma vida de escolhas erradas e, sempre que eu ficava sem grana, saía para cortar cabelos. A ideia de assumir a profissão nasceu em um momento ruim. Eu morava na rua, então comecei a cortar cabelos na comunidade de moradores de rua, e ali nasceu o sonho de um dia ter um negócio e mudar minha história”, relembra William.

“O Selected nasceu quando eu saí do sistema prisional, com tornozeleira eletrônica, e comecei a cortar cabelo na churrasqueira do meu pai. Juntei R$ 500,00 e fui para a casa da minha irmã, pois lá era mais movimentado, e logo aluguei meu primeiro espaço. Fiquei por lá até tirar a tornozeleira.”

Veio então a primeira unidade do Selected Barber Shop, em Sarandi, bairro de origem de William. E junto com ela veio a preocupação em oferecer opção a jovens que enfrentavam problemas com drogas, ou que estavam direta ou indiretamente ligados ao crime. “Procuramos inserir pessoas em situação de vulnerabilidade social. Formamos pessoas de caráter. Alguns deles hoje administram minha barbearia em Porto Alegre”, conta.

O trabalho social junto a moradores de rua também está na pauta de William. Oficinas de corte de cabelo com a participação de alunos da Selected geram impacto na comunidade.

Um empreendimento com 12 meses de atuação, gerenciado por uma pessoa jovem – William tem 34 anos – já contabiliza 24 jovens de 15 a 27 anos capacitados para o corte. E em breve será realizada a primeira oficina na unidade de Florianópolis.

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William venceu também o concurso Desafio Brasil 2018, do Programa Geração Empreendedora, na categoria jovem empreendedor atuante. Realizado pela Aliança Empreendedora em parceria com a Youth Business International (YBI), com apoio financeiro do BID-FOMIN e Citi Foudation no âmbito do programa de mesmo nome, o concurso oferece aos vencedores capacitação presencial em São Paulo e até R$ 7.500,00 para investimento nos negócios.

“Ganhar esse prêmio foi algo surreal. Tão cedo, e é uma conquista que vou guardar para sempre na minha vida. Tudo conquistado com muita convicção e fé. Muita coisa mudou. Eu era um morador de rua, ex-presidiário, e com muita força de vontade consegui mudar minha história, recuperar meu caráter e ainda ajudar a transformar a vida de outras pessoas. Isso é prova de que qualquer um pode mudar sua história, por mais difícil que seja. É para isso que o Selected foi criado. Não para fazer se der certo, e sim para fazer até dar certo”, diz ele.

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